Membros de dez famílias fumicultoras estiveram reunidos com a equipe técnica do Cepagro na última 5ª feira na comunidade de Barra Negra (Major Gercino) para a apresentação do projeto de Fomento à Assistência Técnica e Extensão Rural para Fumicultores visando à Transição Agroecológica que a organização vai implementar nos próximos dois anos em 100 propriedades do Alto Vale do Rio Tijucas. Durante o encontro, os fumicultores puderam conhecer também as frentes de atuação da entidade, as dinâmicas de grupo da Rede Ecovida de Agroecologia e os possíveis canais de comercialização para a produção de alimentos orgânicos. As ações do projeto serão viabilizadas através de recursos do Fundo para Reconstituição de Bens Lesados do Ministério Público de Santa Catarina. 
por Ana Carolina Dionísio

O coordenador do Cepagro Charles Lamb apresentou o histórico e os eixos de atuação da entidade nos âmbitos rural e urbano

O coordenador do Cepagro Charles Lamb apresentou o histórico e os eixos de atuação da entidade nos âmbitos rural e urbano, além dos diferentes canais de comercialização de alimentos agroecológicos


As estufas de secar fumo já fazem parte da paisagem da zona rural de municípios como Nova Trento, Major Gercino e Leoberto Leal, no Alto Vale do Rio Tijucas, há algumas décadas. Chegada ao redor dos anos 1960, a fumicultura é a atividade principal de centenas de famílias na região e de outras 47 mil em Santa Catarina. Este número, contudo, vem caindo nos últimos anos. Seja pela baixa rentabilidade ou por problemas de saúde decorrentes do uso de agrotóxicos, do contato com as folhas verdes do tabaco ou do excesso de esforço físico, cada vez mais agricultores têm optado por diversificar seus cultivos e gradualmente diminuir sua dependência em relação à fumicultura. É para assessorar estas famílias na transição para o cultivo de alimentos utilizando o manejo agroecológico que o Cepagro vem desenvolvendo desde 2006 ações no âmbito da Diversificação Produtiva em Áreas Cultivadas com Tabaco, sendo que a mais atual é o projeto de Fomento à Assistência Técnica e Extensão Rural para Fumicultores visando à Transição Agroecológica, com recursos do Fundo para Reconstituição de Bens Lesados do Ministério Público de Santa Catarina.
Um dos fumicultores que esteve na reunião da última 5ª é Leonísio José da Silva, de Major Gercino. “Se eu tivesse uma outra opção que me desse o mesmo rendimento, eu já teria largado o fumo”, disse o agricultor, que planta em média 42 mil pés de fumo e faz parte da 2ª geração da família na atividade: “Eu nasci debaixo de um pé de fumo. Trabalho desde os 9 anos na lavoura”, contou. A principal motivação de Leonísio para mudar é o intenso esforço físico demandado pela fumicultura. Mas, assim como outros agricultores presentes, ele demonstrava receio quanto à comercialização dos produtos. Isso porque a garantia de compra de produção, assegurada no contrato que os fumicultores assinam com as corporações do tabaco, é um dos principais fatores que os mantêm na atividade. “O fumo estando bom ou ruim a firma compra”, ressaltou a agricultora Jakeline Diel, também de Major Gercino.
A bióloga Marina Pinto traçou um panorama das cooperativas e organizações locais que podem ser acessadas pelos agricultores

A bióloga Marina Pinto traçou um panorama das cooperativas e organizações locais que podem ser acessadas pelos agricultores


Sabendo deste aspecto, os técnicos do Cepagro mostraram, além do histórico e eixos de trabalho da organização e da Rede Ecovida de Agroecologia, alguns dos canais de comercialização em que atua, como o Box 721 da Ceasa e o Circuito de Comercilização da Rede Ecovida. A bióloga Marina Pinto complementou o quadro falando sobre cooperativas locais que também poderiam ser acessadas pelos agricultores. “O projeto é importante também para entrar em contato com organizações que auxiliam a viabilizar alternativas”, avaliou a técnica. A articulação em rede e a promoção de intercâmbios e trocas de experiências promovidas pelas dinâmicas dos grupos de agroecologia representam, aliás, um contraponto à individualização que o trabalho dentro do sistema integrado de produção da fumicultura acarreta ao longo dos anos.
Outra forte demanda identificada no encontro é por insumos biológicos para a substituição de agrotóxicos. Neste sentido, três das cinco metas do projeto, explicadas pela agrônoma Gisa Garcia, são voltadas à formação técnica para o manejo agroecológico: realização de cursos e oficinas sobre conceitos teóricos e práticas agroecológicas; viagens de intercâmbio para trocas de saberes e a produção de materiais informativos para os agricultores. Também estão previstos seminários temáticos para mobilização de famílias, assim como o estabelecimento do plano de manejo para transição agroecológica das propriedades. Dentro deste último objetivo, já estão marcadas visitas para fazer o diagnóstico e iniciar o preenchimento do plano de manejo de cinco propriedades na localidade de Diamante, em Major Gercino.
Ex-fumicultores também participaram da reunião, como Ernande Stolarczk, que participa do Grupo Associada da Rede Ecovida de Agroecologia (Nova Trento) e Geovane Cognacco, que estimulou o pai a trocar o cultivo de quase 200 mil pés de fumo pela produção de alimentos em Leoberto Leal e hoje planta uva orgânica. Seu pai, Gilmar Cognacco, realiza semanalmente uma feira agroecológica em Brusque, além de fornecer produtos para o Box 721 da Ceasa. A presença de ambos foi importante para reforçar a viabilidade das alternativas à cultura do tabaco, além de aportar conhecimentos sobre o manejo agroecológico das propriedades. Como afirmou o coordenador do Cepagro, Charles Lamb: “Não tem mais mistério sobre a agroecologia. Mas não é uma solução milagrosa, que acontece de uma hora pra outra”, ressaltando que o processo de transição sempre é gradual, podendo levar de três a cinco anos.