por Fernando Angeoletto / Cepagro (texto e fotos)
A centralidade do alimento nas discussões globais é um dos reflexos para as projeções que apontam, para 2050,  o nascimento do décimo bilionésimo habitante do Planeta Terra. Diante dos desafios de garantir o direito universal ao alimento a este expressivo contingente, ofertando-lhes comida de verdade e cumprindo as agendas de minimizar os impactos ao ambiente, diversos debates e iniciativas são realizados em escala mundial – da ecogastronomia ao ressurgimento de mercados locais, passando pelo enfrentamento aos alimentos transgênicos e a formulação de políticas públicas, ainda que tímidas, para a ampliação das práticas agroecológicas em territórios de agricultura familiar.
Embora com atraso, já que somos a única capital brasileira ainda não aderida ao SISAN, na última semana Florianópolis realizou um importante passo como articuladora local desta política pública, construída há mais de uma década, que insere a temática da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) em um processo intersetorial e dialogado com a sociedade civil. Através da III Conferência Municipal, o município utilizou o recém-criado COMSEAS (Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável) para realizar um diálogo ampliado  e a construção de propostas, alinhadas em 3 eixos temáticos, que serão encaminhados ao Executivo local.

O recém-criado COMSEAS empenhou-se na organização da Conferência

O recém-criado COMSEAS empenhou-se na organização da Conferência


Como palestrante convidado a discutir o tema central da Conferência – “Comida de Verdade no Campo e na Cidade, por Direitos e Soberania Alimentar” – o Mestre em Agroecossistemas e presidente do CONSEA/SC Marcos José de Abreu esclarece que a conceituação de SAN, e seu conseqüente entendimento sobre segurança, deve estar menos relacionado a aspectos sanitaristas e mais preocupado com a garantia ao Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA). “Nesta vida pós-moderna, onde a demanda por equipamentos como restaurantes e lanchonetes para se alimentar torna-se um a necessidade crescente, muitas vezes o simples fatos de ter alimentos frescos e poder cozinhar em casa já configura esta ‘Comida de Verdade’”, ilustra.
O presidente do CONSEA/SC defende que o conceito de segurança deve estar atrelado ao DHAA

O presidente do CONSEA/SC defende que o conceito de segurança deve estar atrelado ao DHAA


Em que pese ainda o aspecto da segurança do alimento, Marcos enfatiza que o verdadeiro vilão é o agrotóxico, e que poderíamos ter uma lei para banir seu uso em todo o município. Considera ainda fundamental a discussão de SAN na perspectiva de um território bem peculiar, dadas as dimensões e restrições de circulação da parte insular, onde concentra-se mais de 90% do município de Florianópolis. “A gestão de resíduos orgânicos faz parte deste olhar intersetorial. Não podemos seguir jogando fertilidade no lixo, para depois mandar tudo a um aterro com alto custo econômico e ambiental”, defende ele, relacionando a prática da compostagem ao potencial para amplificar a agricultura urbana e o acesso a alimentos frescos. Espelhando-se em exemplos locais de reconhecida eficiência, como a Revolução dos Baldinhos, este discurso já transcende o que seria um horizonte longínquo e incorporou-se ao propósito de gestores locais, conforme defendeu recentemente o presidente da COMCAP, Marius Bagnatti, em ampla reportagem sobre o tema publicada no Jornal Notícias do Dia.
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A Comida de Verdade servida no evento, composta por matérias primas locais e agroecológicas, fluiu com o toque do chef Fabiano Gregório e ativistas locais do movimento Slow Food


Ao concluir suas rodadas de discussões e formulação de propostas, que serão disponibilizadas em breve, a III Conferência Municipal homologou também as candidaturas de delegados à V Conferência Estadual de SAN, que acontecerá em agosto.