Já dizia Ana Primavesi: “Solo é vida e é a base da vida. Há muita vida nele e muita dependência dele”.

Este ensinamento ecoou no último sábado, 23 de abril, durante o intercâmbio sobre manejo e semeio de adubos verdes realizado na Comuna Amarildo de Souza. Colocando experiência prática e conhecimentos científicos lado a lado, o agricultor e a agrônoma assentados, Valdemir dos Reis Fiuza e Bárbara Ventura, ensinaram na prática a outros agricultores, como usam a adubação verde para nutrir o solo e melhorar a produção de alimentos no Assentamento.

Agricultores reunidos na roça de milho do Assentamento Comuna Amarildo

A atividade foi realizada por meio do projeto Culturas de Cobertura para a Próxima Geração que tem o apoio da Conservation, Food & Health Foundation e é coordenado pelas agrônomas do Cepagro, Letícia Dambroz Filipini e Renata Lucas. O objetivo da atividade foi promover a troca de conhecimentos sobre esta prática agroecológica de manejo de solo, que diferentemente da agricultura convencional ou orgânica, busca romper com a dependência de insumos externos. A adubação verde consiste no cultivo de espécies com potencial para a produção de material vegetal, que pode ser incorporado ao solo ou usado para cobri-lo, melhorando assim a sua fertilidade, além de proporcionar proteção ao solo, aumentar a biodiversidade e atrair polinizadores.

Valdemir, mais conhecido como Val, é certeiro ao afirmar: “o mais importante para nós que estamos na Agroecologia é a matéria orgânica”.

Isso porque, como explica Letícia Filipini, uma das principais funções da matéria orgânica é agregar e estabilizar o solo. É  também a matéria orgânica que dá aporte de energia e nutrientes para os micro-organismos do solo, que atuam na decomposição da biomassa, disponibilização de nutrientes para as plantas, estimulam a saúde das plantas, protegendo-as contra patógenos, além de aumentar a resistência a estresses abióticos, como estiagens ou secas. “Por isso, a preservação da matéria orgânica e dos micro-organismos está associada à saúde do solo e à sustentabilidade agrícola”, afirma Letícia.

Valdemir dos Reis Fiuza, agricultor assentado da Comuna Amarildo de Souza

Durante o intercâmbio, Val explicou como costuma manejar a adubação verde em consórcio com o milho: em uma mesma área, utiliza no verão o consórcio de milho com feijão de porco, fazendo no ano seguinte o cultivo rotacionado com hortaliças. No inverno utiliza o consórcio de aveia preta e ervilhaca. Mas o mais interessante na experiência da Comuna Amarildo, que serve de exemplo, segundo Letícia, é o fato de não utilizarem o revolvimento de solo, prática muito comum entre agricultores agroecologistas.

Letícia explica que fazer revolvimento de solo “ao longo do tempo traz impactos negativos como por exemplo o aumento de erosões e perda da matéria orgânica. Para a produção agroecológica não revolver o solo ainda é um grande desafio, por isso o caso do manejo realizado na Comuna é muito interessante e o que esperamos é a multiplicação de manejo dessa forma por outros agricultores”, complementa.

Diagnosticar para tratar

Outro ponto tratado no intercâmbio foi a importância da análise de solo. “O solo é um organismo vivo, então dá pra fazer uma analogia com um diagnóstico médico. Nós temos que saber como está a saúde do solo e por isso a gente faz a análise”, explica Bárbara Ventura. Para a análise ser precisa, a coleta de solo deve ser feita da maneira correta, o que inclui pegar amostras de diferentes pontos da área que se deseja analisar e na profundidade correta. Segundo Bárbara, a época ideal para fazer a análise é quando o solo está descansando entre um cultivo e outro, assim o/a agricultor/a tem tempo hábil para corrigir o que for preciso antes do novo plantio.

Bárbara conta que na Comuna a análise de solo não é feita tanto quanto se gostaria, já que isso tem um custo – a partir de R$ 30,00 por amostra, variando com o tipo de análise – , mas avalia como muito importante. “É importante ter a parte da ciência na Agroecologia. Ela te ajuda a entender o que o solo precisa e como melhorar a produção”, conta Bárbara.

Imagem da Bárbara coletando uma amostra de solo

As pessoas presentes na atividade também arregaçaram as mangas e fizeram um mutirão para a colheita do milho crioulo que vai servir de semente e viram na prática como Bárbara e Val fazem o semeio da ervilhaca e aveia: a lanço.

Agroecologia é prática, ciência e movimento

Se os anos de pandemia dificultaram a mobilização dos agricultores, um encontro presencial como o de sábado lembra que a Agroecologia se faz no coletivo, nas trocas entre agricultores/as e na experimentação. Como orienta Ana Primavesi, “a Agroecologia depende muito da sabedoria de cada agricultor desenvolvida a partir de suas experiências e observações locais”, porque trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando as características locais.

Val, Angélica e Bill conversando.

Entre os participantes da atividade estavam Angélica Gehlen e Bill Oliveira, que possuem um sítio em Imbituba e estão na Rede Ecovida há 3 anos. Depois de dois anos quase sem reuniões presenciais de grupo, Angélica agradece a oportunidade do intercâmbio: “Consideramos fundamental estas trocas pois são com elas que temos incentivo e conhecimento prático para seguir. Tem também a questão de se espelhar nas boas lideranças”.

Além de prática e ciência, Agroecologia é movimento social e Val reforça esse ponto: “Minha formação é no dia a dia. E eu também aprendi muito nas reuniões da Rede e do Núcleo Litoral Catarinense. As reuniões são um momento de recarregar as baterias. Às vezes a gente tá pra baixo e na reunião a gente se renova”.

Se você quiser saber mais sobre adubação verde, te convidamos a assistir a série audiovisual Adubação Verde e Agroecologia e baixar a cartilha Adubação Verde: ferramenta da Agroecologia, materiais que foram elaborados através do projeto “Culturas de Cobertura para a Próxima Geração” com apoio da Conservation, Food & Health Foundation.