Para tornar-se um consumidor responsável, tão importante quanto ter consciência do que se consome, é saber fazer a destinação correta dos resíduos. Foi pensando nisso que o 4º e último módulo do curso ‘Consumo consciente, responsável e agroecologia’ teve como tema a compostagem e a gestão comunitária dos resíduos. Organizada pelo Cepagro, a formação aconteceu entre os dias 28 e 29 de setembro e contou com a participação de cerca de 50 agricultores e consumidores do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Num curso voltado para a compostagem e o consumo consciente, é fundamental conhecer experiências práticas que abordam esses temas. Assim, o curso apoiado pela Misereor em Rede iniciou sua programação no sábado de manhã com a visita à duas iniciativas no bairro Campeche: a Destino Certo para Resíduos Orgânicos e a Horta Comunitária e Pedagógica do PACUCA. 
Num terreno com cerca de 1.000 m² numa das esquinas mais movimentadas do bairro – Avenida Campeche com a Rua Pau de Canela – Eduardo Elias, idealizador da Destino Certo, mantém um pátio de compostagem que recebe resíduos orgânicos dos restaurantes e pousadas locais. Eduardo faz a coleta semanal do resíduo orgânico de restaurantes, lojas de produtos naturais, escolas e condomínios do bairro, em dias alternados, trazendo entre 2 e 2,5 toneladas de restos de comida para compostar no pátio. O composto produzido vai para a horta anexa ao pátio, onde ele produz verduras e legumes orgânicos, que voltam para os restaurantes. 
Eduardo também comercializa o composto, fechando um ciclo de produção – consumo – produção de alimentos na cidade – ou, como ele chama, sintropia urbana. “Na lógica da sintropia urbana, nós fechamos os ciclos localmente”, explica Eduardo, que reforça que um dos objetivos da Destino Certo é também gerar consciência ecológica sobre nossos resíduos e estimular a reflexão sobre nossos padrões de consumo. “Queremos construir a noção de que resíduo orgânico é recurso, não é lixo”, afirma. 
Dali, o grupo seguiu para a Horta Comunitária e Pedagógica do PACUCA, instalada em 2015 através de uma intensa luta política e jurídica da comunidade por mais áreas verdes e de convivência no bairro. Numa área altamente visada pela especulação imobiliária, a Horta do PACUCA recebe e composta os resíduos orgânicos de cerca de 200 famílias do bairro, compostando em torno de 100 toneladas de resíduos ao ano, calcula o coordenador da Horta, Ataíde Silva. “A Horta marca a presença da comunidade na cidade, agregando o fator da produção de alimentos”, disse. 
Verduras e legumes do PACUCA chegam a escolas e asilos da comunidade, além de bairros periféricos da Grande Florianópolis, como Brejaru, Monte Cristo e a Ocupação Marielle Franco. A Horta também tem canteiros de plantas medicinais, que frequentemente são compartilhadas com usuários/as do Centro de Saúde do Campeche, que fica ali próximo.
Depois das visitas, o coletivo aprofundou os conhecimentos no tema com a oficina de compostagem facilitada pelo engenheiro agrônomo do Cepagro, Júlio Maestri. Júlio iniciou a oficina contando um pouco sobre a compostagem ao redor do mundo e ao longo da história. De forma sempre lúdica e participativa, ele explicou os processos da compostagem e seus diferentes modelos e dimensões, do âmbito doméstico ao municipal. Com as dúvidas sanadas, os/as cursistas partiram para a prática e juntos/as construíram uma composteira.
E como onde há consumo consciente, há alimentação agroecológica, o sábado terminou com um jantar feito com alimentos locais de agricultores/as agroecológicos/as e orgânicos/as da Rede Ecovida. Teve suco orgânico de Major Gercino, legumes de Leoberto Leal e Biguaçu, queijo, mel e receitas de engenho de Angelina. Além disso, integrantes do próprio grupo trouxeram feijão da serra, arroz do sul além da kombucha feita pelas consumidoras do litoral. Ou seja, na alimentação ofertada durante os dias de formação, consumidores/as e produtores/as estiveram realmente em rede.
E essa é a proposta do curso, que faz parte do projeto ‘Promoção da articulação entre o campo e a cidade em dinâmicas locais e regionais de abastecimento, conjugado com incidência política em soberania e segurança alimentar’ apoiado pela Misereor em Rede. A fim de formar consumidores conscientes e aproximá-los dos agricultores, o curso foi dividido em quatro módulos, planejados pelas organizações que compõem o projeto: AS-PTA, com sede em Palmeira (PR), Vianei, de Lajes (SC), CETAP, de Passo Fundo (RS) e Cepagro, com sede em Florianópolis (SC). 
De maio de 2018 até agora, os cursistas receberam formações sobre o tema das sementes crioulas, de sistemas agroflorestais e extrativismo, passaram pelo abastecimento e comercialização e agora encerram com a destinação dos resíduos orgânicos. Assim, no domingo a programação se voltou para a avaliação do curso. Os grupos presentes compartilharam suas reflexões sobre os aprendizados adquiridos até aqui e sobre os próximos passos para a manutenção dos coletivos formados. Todos eles indicaram que, independente de projetos, enquanto consumidores conscientes, continuarão fazendo formações , encontros e trocas entre si.
Na avaliação de Erika Sagae, que ao lado de Eduardo Rocha representa o Cepagro no projeto da Misereor, além dos aprendizados no sentido do consumo responsável, o curso foi importante enquanto um processo de formação para atuar na incidência política. Com o andamento do curso, a consumidora de Florianópolis Irene Shimomura, por exemplo, passou a fazer parte do Grupo Ilha Meiembipe, da Rede Ecovida. Por conta da sua participação no grupo, hoje, ela é também conselheira no Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional de Santa Catarina. Além da Irene, o Ilha Meiembipe também ganhou representação de agricultores no Consea, “o que foi importante porque trouxe a produção primária para dentro do Conselho e para a construção da política municipal de segurança alimentar e nutricional”, conta Eduardo Rocha.
Na avaliação, o grupo do Centro Vianei trouxe principalmente a importância da autoformação e o envolvimento com outros temas. O grupo conta com pessoas de diversas áreas e isso também contribuiu para a formação de cada um. A professora Kauane Pionoski, de São João do Triunfo, faz parte do grupo formado pela AS-PTA e reforçou uma avaliação feita por ela ainda no primeiro módulo ao dizer que se há racismo, homofobia, misoginia e outras práticas de discriminação, não é Agroecologia. Também ficou como avaliação a importância de levar tudo o que gira em torno da Agroecologia à outros grupos e espaços.
Ao final da avaliação coletiva, os participantes receberam os certificados juntamente com um pacote de composto orgânico e uma muda de araucária. Os/as consumidores/as e agricultores/as se despediram com a certeza de um próximo encontro marcado para outubro, como um compromisso entre os grupos para além das instituições. Também ficou definida a participação de quatro cursistas no Encontro Ampliado da Rede Ecovida, em novembro. Eles/as farão uma oficina sobre consumo consciente.